Quando comecei a publicar stories no Instagram, me deparei com os gurus do marketing — os quais indicavam livros para você melhorar o seu perfil, a sua — preparem-se — presença na internet.
Bem, aprender coisas em livros deve ser uma das minhas maiores habilidades, então lá fui eu.
Eu realmente esperava que, indo direto à gringolândia marqueteira, fosse encontrar receitas aplicadas por pessoas de sucesso no Brasil. Isto é: eu realmente acreditava que a prática brasileira seria essencialmente uma aplicação de teorias gringas.
Nesse ponto, é um tanto inevitável você se deparar com a famosa «jornada do herói». O sujeito está lá, calmo, comendo Cheetos no seu «mundo comum», quando alguma coisa o atiça. Ele resiste, mas o desejo é mais forte. Sua vida será transformada. Ele vai encontrar um guia, que lhe dará ferramentas, vai adquirir habilidades e testá-las, e, no fim, vai voltar vitorioso para casa, mais inteligente e coisa e tal.
Também já disse várias vezes que não tenho nada contra o uso desse modelo para vender sabonetes ou para fazer filmes de super-herói (que são uma dimensão do marketing mais do que de alguma «arte cinematográfica»), mas sim contra a afirmação, totalmente absurda, de que a «jornada do herói» é uma estrutura básica de todos os mitos de todas as religiões. Realmente, acho que é muito fácil ver que ela é apenas uma estrutura básica do orgulho. Ela mostra como você deixa de ser uma versão pior de você para passar a ser uma versão melhor de você, e finge que não percebe que esse «melhor» significa «mais admirável para os outros», «mais desejável pelos outros».
Porém, quanto mais observo os produtos culturais, os cursos online vendidos para as direitas da internet, vejo que as estratégias são na verdade contrárias à jornada do herói.
O motivo é simples: a jornada do herói pressupõe que você saia de uma situação estável, mas medíocre, e encontre as ferramentas e o guia (o vendedor do produto seria o guia — isso na cabeça do estrategista de marketing) que vão levar você por um caminho instável. Por mais que a «jornada do herói» me pareça ligeiramente ridícula, ela tem um algo de positivo, de interessante, que é o desejo de aventura.
Ela marca a diferença entre a pessoa que fica em casa e a pessoa que assume o risco de um futuro indefinido.
A «jornada do herói», invenção americana, tem algo do sonho americano: o imigrante que vai em busca do novo mundo, da nova situação, que ele espera que seja melhor, embora não saiba exatamente qual será. O estudante que entra no college de humanas, ou liberal arts, o qual não tem nada de profissionalizante, com uma abertura para escolher suas matérias que seria totalmente impensável no Brasil. A ideia é justamente abrir a cabeça, e não formar operários.
Do definido para o indefinido. Do conhecido para o desconhecido. Do estável para o instável. Do garantido para o Deus sabe como vai ser.
Acho que o parágrafo anterior já bastou para mostrar que essa mentalidade é exatamente contrária à mentalidade brasileira e aos anseios da maioria dos brasileiros.