Pedro Sette-Câmara

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111 «Nefarious»: uma fantasia do subsolo

111 «Nefarious»: uma fantasia do subsolo

Ou: uma desajeitada cartinha de amor à esquerda

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jun 09, 2024
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111 «Nefarious»: uma fantasia do subsolo
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Recentemente, publiquei um «Prefácio a um texto ainda não enviado»; o texto que ainda não tinha sido enviado é justamente este aqui, sobre o filme Nefarious.

Espero com o texto dar uma ideia da força da obra Memórias do subsolo, e lembro que, caso o leitor queira entender ainda melhor o tema, está disponível meu curso O mapa do subsolo.

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Introdução

Nefarious, o filme que tanto fez sucesso entre cristãos de direita em 2023, pode ser resumido a uma reencenação de dois momentos do primeiro capítulo da segunda parte de Memórias do subsolo, de Dostoiévski.

Não se trata, porém, de uma reencenação deliberada, mas inconsciente. Se Memórias do subsolo escancara o estado de humilhação paralisada e ressentida que Dostoiévski denominou «subsolo», Nefarious apenas apenas deixa entrever esse mesmo estado, porque não é movido pelo desejo de investigação e de revelação da verdade de uma situação que move a melhor arte moderna, mas pelo desejo de marcar uma posição, de obter uma vitória na «guerra cultural».

Assim, o interesse de Nefarious não é propriamente artístico, mas quase antropológico. O filme é um sintoma de uma situação — especificamente, da interação entre o desprezo da zelite cultural das universidades e da grande mídia, de um lado, e, de outro, a raiva dos cristãos de direita que aquela zelite examina e diagnostica à distância, mas nunca ouve como iguais.

1 Primeiro momento: a «transposição acusatória»

Vejamos o primeiro desses momentos. Naquele primeiro capítulo da segunda parte de Memórias do subsolo, o narrador, humilhado por um oficial que o tratou como um mero objeto inanimado, passa muito tempo sonhando com uma vingança e fazendo planos elaborados para executá-la. Um dos modos de executar a vingança é a publicação de suas fantasias:

Uma vez, de manhã, embora até então nunca fosse dado às literaturas, veio-me de repente a ideia de descrever aquele oficial numa transposição acusatória, caricatural, em forma de novela. Foi com prazer que a escrevi. Eu acusava, cheguei a caluniar até; a princípio, dei-lhe um sobrenome que podia ser de imediato reconhecido, mas, depois de maduras reflexões, modifiquei-o e mandei o escrito para os Anais da Pátria. (Dostoiévski. Trad. Boris Schnaiderman. Memórias do subsolo. Rio de Janeiro: 34, p. 65.)

Nefarious é justamente essa transposição acusatória.

(Aliás, esse é o primeiro motivo pelo qual o filme é diabólico. O diabo, Satanás, é quem acusa; em hebraico, satan é o adversário, o acusador. Mas também é um filme diabólico pela raiz grega: diábolos é aquilo que desune. Toda vez que uma produtora propõe uma obra que pretende lisonjear os egos ideológicos feridos de seus clientes cristãos e isolá-los do resto do mundo, ela está sendo etimologicamente «diabólica».)

No enredo de Nefarious, o psiquiatra James Martin (alguma alfinetada no padre James Martin, que trabalha com homossexuais?) tem de certificar que Edward Wayne Brady está em plena posse de suas capacidades mentais e pode ser executado às 23h daquela noite. O detalhe é que Brady está possuído pelo demônio Nefarious — o qual, por sua vez, gosta tanto de falar que o filme poderia intitular-se Entrevista com o capeta.

E quem é James Martin? Aqui começa a fantasia de vingança. Martin é justamente um típico representante da zelite que humilha cristãos, sobretudo aqueles cristãos de direita da região conhecida como Bible Belt, e que inclui o estado de Oklahoma, onde se passa o filme. Martin representa tudo aquilo que a direita cristã condena: esses progressistas que fogem de uma vida baseada no dever e que ainda votam na Hillary Clinton — a qual chama esses cristãos direitosos de «basket of deplorables». Ateu, rico, um verdadeiro almofadinha que tem a insolência de entrar de Mercedes no presídio, cheio de si, um señorito satisfecho orteguiano, que, segundo o capeta, foi conivente com a eutanásia da mãe para receber uma herança de 3,6 milhões de dólares; um homem de 35 anos que pretende terminar com a namorada e é conivente com o aborto que ela está prestes a realizar, porque «as coisas são complicadas» e porque ele «não se sente pronto para ser pai».

Só faltou dizer, seguindo a mais venerável tradição acusatória, que Martin matou o pai e se casou com a mãe.

Em vez disso, mas não «ao invés disso», o cristianíssimo filme nos informa que o demônio Nefarious tem Martin em tão alta conta que espera angariar seu apoio para a redação do livro que contará a história de Nefarious desde o ponto de vista de Nefarious. Desse destino Martin escapará, numa sugestão de final feliz. Numa tragédia grega, as acusações contra o personagem levariam à sua morte. Em Nefarious, o final feliz consiste em o protagonista… aceitar as acusações do capeta, numa «salvação» que se resume a uma conversão ideológica. Martin adotará a cosmovisão dos roteiristas do filme, e escreverá não o livro que Nefarious quis, mas um livro de alerta quanto ao demônio.

Em suma, o «deplorável» roteirista, humilhado pelos James Martins da vida, faz um filme em que humilha o humilhador. É a mesma fantasia vingativa, a mesma «transposição acusatória, em forma de novela», escrita pelo narrador de Memórias do subsolo.

2 «Uma grande batalha entre o bem e o mal»

O próprio filme confirma o ponto de vista de quem sente que sua dor está sendo ignorada. Perto do fim, James Martin profetiza, em seu momento redentor:

Está acontecendo uma grande batalha. Não importa se sabemos disso ou não. A batalha entre o bem e o mal. E… todos participamos dela. Querendo ou não.»

Está acontecendo uma grande batalha na cabeça das pessoas que acreditam na «guerra cultural». Na cabeça das pessoas que julgam que estão perdendo essa batalha (porque não controlam a grande mídia) e querem dizer que todos participamos dela, querendo ou não, para pedir socorro.

Só posso entender essa frase dessa maneira pragmática, dentro desse contexto, porque em si mesma ela é não apenas falsa como profundamente anticristã. Se você está na pior, humilhado, mas ainda pretende resistir, até entendo que você faça como o Jó do Livro de Jó e declare, exasperado, na tradução latina (7, 1): Militia est vita hominis super terram, «A vida do homem na terra é uma batalha» (o texto hebraico admite outra interpretação). Ninguém é de ferro.

Mas, se você é um cristão calmo, sóbrio, é fácil ver que «uma grande batalha entre o bem e o mal» é uma metáfora péssima para a vida. No cristianismo, Deus já ganhou, e o mal, retomando a fórmula de Santo Agostinho, é apenas a privação do bem. O que existe é, no máximo, o bem e o ruído, o qual podemos chamar de pecado.

Um outro problema da ideia de «existe uma batalha da qual todos participamos, querendo ou não» é que aqueles que declaram isso estão pondo a si mesmos do lado do «bem», e que aqueles que discordam da ideia de que essa batalha existe estão, só por discordar, do lado do «mal». Somos, na melhor das hipóteses, idiotas úteis.

Essa é mais uma das compreensíveis fantasias do subsolo. Se você se sente humilhado, você vê a humilhação por toda parte, e chama isso de «guerra» — até para proteger-se da dura realidade subsolesca de sentir-se humilhado por uma pessoa que você alega desprezar.

Só essa fantasia pode explicar que que um cristão fique empolgado com um filme por causa das acusações supostamente verdadeiras enunciadas pelo «pai da mentira» & «homicida desde o princípio». Só essa fantasia pode explicar que um cristão não se lembre de que o Espírito Santo é o Paráclito, literalmente o advogado de defesa, o qual não se furtaria de defender… James Martin. Se o espírito de acusação ouve no «é complicado» de Martin apenas a prova definitiva, o espírito de defesa encontra nessa pequena frase o fio que pode ser puxado para desatar os nós que prendem uma vida.

3 Ação demoníaca?

Muitos cristãos também gostam de repetir que «o grande trunfo de Satanás foi convencer as pessoas de que ele não existe». A importância que se pretende dar a Satanás em pessoa parece contrastar com o que diz Jesus Cristo: «Estou vendo Satanás cair como um relâmpago» (Lucas 10, 18). E também parece outra fantasia, esta com o fim de proteger o homem da visão do seu próprio mal: não foi Satanás quem inventou a bomba atômica, nem o gulag, nem Auschwitz, nem a escravidão, nem o aborto industrializado.

Ao dizer isso, será que eu, que sou católico, estou contrariando a Igreja? Até onde sei, a Igreja só reconhece a ação direta do demônio em situações muito restritas, e sempre recomenda cautela:

Por esse motivo, o ensinamento cristão, assegurando vigorosamente a liberdade e a grandeza do homem, iluminando plenamente a onipotência e a bondade do Criador, não exibe falta de firmeza. Ele culpou no passado e condenará sempre a facilidade excessiva em criar pretextos para alguma solicitação demoníaca. Proibiu tanto a superstição quanto a magia. Recusou toda capitulação doutrinal diante do fatalismo e toda abdicação da liberdade diante da força. Mais ainda, a partir do momento em que se fala de uma possível intervenção diabólica, a Igreja sempre abre espaço, assim como faz com o milagre, para a exigência crítica. A reserva e a prudência são efetivamente obrigatórias. É fácil ser enganado pela imaginação, deixar-se levar por relatos inexatos, transmitidos de maneira desajeitada ou interpretados abusivamente. Assim, tanto aqui como alhures, é o caso de exercer discernimento. E é preciso deixar aberto o espaço para a pesquisa e para seus resultados.

— «Foi chrétienne et démonologie», site do Vaticano

4 «Amor sacrificial»

Outra acenada para o público direitoso que vai sustentar o filme está na sugestão do demônio Nefarious de que James Martin nem sequer cogita tornar o «amor sacrificial» o centro da sua vida.

Muitos cristãos julgam que o sacrifício é a marca do amor cristão, mas a marca do amor cristão é a alegria. A alegria vem em primeiro lugar. Já falei da diferença de tradução que há em Hebreus 12, 2: diversas Bíblias católicas dizem que Cristo «rejeitou a alegria e suportou a cruz», ao passo que outras traduções (praticamente todas as traduções inglesas, por exemplo) dizem que Cristo «por causa da alegria, suportou a cruz». Não apenas isso faz mais sentido, como não é… masoquista.

O masoquismo, ao menos no sentido de René Girard (e, nesta newsletter, Girard está sempre por perto) consiste nessa inversão: se não há sofrimento, então não estou na presença daquilo que vale a pena, não estou na presença de uma divindade verdadeira. Isso é o contrário da graça, que é, literalmente, uma gratuidade. Uma coisa é fazer um sacrifício por causa da alegria; outra coisa é fazer um sacrifício porque você acha que isso prova que o seu amor é de verdade. Nesse segundo caso, você invariavelmente fica esperando uma medalha.

Essa medalha pode vir na forma de posts viralizáveis em que você fala da importância do sacrifício. O objetivo dessa medalha é atestar a sua superioridade moral. Mesmo, que no subsolo, você se sinta interiormente pior do que todo mundo, para os olhos de todo mundo você tem de ser plenamente justificado.

No mais, o masoquismo também exige sacrifícios, os quais podem ser totalmente inúteis. Você pode dominar a expressão das suas emoções, nunca se mostrar vulnerável, nunca admitir que deseja o que deseja, tudo para sustentar uma imagem pública de pessoa séria e sensata, de que está tudo bem. Você pode modificar muito seu próprio corpo achando que assim vai conquistar uma pessoa que, na verdade, já gostava de você. Você pode pagar milhares de dinheiros para fazer treinamentos que vão fazer você se sentir glamuroso, mas que não trarão nenhum resultado. Assim, não restará nada além de valorizar… o próprio sacrifício.

E o que é o satanismo em sentido estrito se não a exigência de sacrifícios inúteis? O satanismo é um «amor sacrificial» em sentido mais estrito do que o amor cristão, em que o sacrifício é uma graça, e não uma exigência transacional. Penso num famoso satanista: David Berkowitz, que ficou conhecido como the son of Sam por seu envolvimento em assassinatos em série na Nova York dos anos 1970. Ele bebeu o sangue de cachorros mortos em rituais, matou gente, e… foi preso. A melhor coisa que lhe aconteceu foi uma conversão ao cristianismo na prisão. O arrependimento estampado em seu rosto é muito impressionante.

Na guerra cultural, um James Martin só pode ser subjugado e humilhado. Ele é convertido para a «grande batalha». Por outro lado, na famosa vida real, Deus tem mais espaço para um David Berkowitz do que o subsolo da guerra cultural tem para um psiquiatra ateu fictício.

5 Segundo momento: um apelo desesperado e indireto ao «outro lado»

Compus uma carta linda e atraente, implorando-lhe que se desculpasse perante mim; e, para o caso de uma recusa, aludia com bastante firmeza a um duelo. A carta foi escrita de tal modo que, se o oficial compreendesse um pouco sequer o «belo e sublime», seguramente viria correndo à minha casa, para se atirar ao meu pescoço e oferecer sua amizade. E como seria bom! Viveríamos tão bem, como amigos! Tão bem! Ele me defenderia com a imponência de sua posição; eu o tornaria mais nobre com a minha cultura, bem… com as ideias também, e muito mais coisa poderia acontecer!

Memórias do subsolo, p. 65

Se eu escrevesse um texto condenando as coreografias indecentes das dançarinas de funk e a decadência dos costumes, o leitor não teria muita dificuldade em enxergar nesse texto a cobiça reprimida por essas dançarinas, nem minha ânsia inconsciente de participar dessa gloriosa decadência. Meu texto trairia um desejo devidamente escondido e recalcado.

Pelo mesmo raciocínio, fica fácil ver que a crítica à grande mídia pode muito bem esconder o desejo de fazer parte dela.

(Não, não estou dizendo que toda crítica apenas esconde o desejo de unir-se à coisa criticada. Mas estou dizendo, com certeza, que o modo a crítica é feita, e a ocasião em que a crítica é feita, dizem algo a respeito do crítico.)

A crítica, então, pode esconder um apelo desesperado a quem está sendo criticado. Digo «desesperado» no sentido mais simples de «sem esperanças»: não creio que possamos ser amigos, não creio na nossa união, mas, muito indiretamente, não deixei de falar com você. Esse meu anseio sem esperanças é traído pela minha crítica.

Por outro lado, uma obra como Memórias do subsolo não trai desejos recalcados, mas revela-os imediatamente. Ela expõe a dependência do homem do subsolo em relação àqueles que dominam sua imaginação. Depois que o homem do subsolo se sente humilhado pelo oficial, o oficial se torna um símbolo de autonomia e de poder, uma divindade; o que o homem do subsolo quer é a união com esse oficial. Após um gesto de submissão deste — o sonhado pedido de desculpas —, os dois poderiam começar uma linda amizade. Seria a mesma coisa que eu escrever uma história na qual, após criticar o funk carioca, recebo uma visita de uma dançarina arrependida, para quem passo a dar aulas de Dostoiévski à luz de René Girard. Deslumbrada com minha sabedoria, ela se submete de bom grado aos meus desejos mais vis.

Nefarius é isso mesmo: uma carta de fascínio muito indireta a esse humilhador de cristãos de direita — o qual, caso venha a «pedir desculpas», pode se tornar nosso amigo.

(Numa nota à parte, ainda é possível enxergar interpretar o filme a partir do canibalismo dos tupinambás, retratado, por exemplo, no filme Como era gostoso o meu francês. Os tupinambás prendiam um bravo guerreiro inimigo. Este, então, passava a receber um tratamento de luxo, que incluía o contato com as mulheres da tribo. Depois de um tempo, ele era estimulado a cometer transgressões, ou era diretamente provocado, num duelo — tudo para que a agressão definitiva contra ele parecesse justificada. Enfim era morto e comido, isto é, assimilado. Nefarius também é isso: James Martin é provocado, e o velho Martin, ateu, almofadinha, e assassino, é morto para que o novo Martin possa ser assimilado como «um de nós».)

6 E há solução?

Se, no Brasil de hoje, uma produtora cristã de direita escrevesse um filme em que Gabriela Prioli é humilhada, calada pela força dos argumentos, para depois ressurgir com uma camiseta bolsonarista, talvez eu não precisasse escrever tanto. Mas preciso, porque o que está em jogo não é apenas um caso isolado. O que está em jogo é uma situação generalizada — o subsolo — já descrita pelo menos desde 1864, quando Dostoiévski publicou Memórias do subsolo.

É talvez inevitável que o leitor esteja se perguntando «como resolver isso». Já na década de 1940 Georges Bernanos reclamava de dar palestras e sempre ouvir a pergunta «mas como resolver isso?».

Aqui não preciso me furtar a isso.

Se o subsolo for visto como um problema, ele tem pelo menos duas soluções, nenhuma das quais é simples. Porém, a primeira é muito mais simples do que a segunda, e já está na literatura — inclusive na literatura do próprio Dostoiévski.

A primeira solução é sair do subsolo individualmente. Isso pode exigir terapia, ou pode exigir uma conversão romanesca. Um resultado seria perceber que o famoso outro lado não é tão terrível quanto você imagina. Ele não é tão autonomamente cego a ponto de parecer uma divindade maligna. O oficial divinizado pelo narrador de Memórias do subsolo é apenas um homem. São as acusações que divinizam o rival. No caso de Nefarius, a tripla acusação de assassinato faz com que James Martin só se torne «acessível» depois de uma transmutação ideológica. Martin é que tem de aprender a falar como cristão, não os cristãos que têm de dar um jeito de chegar a Martin.

Agora, essa primeira solução pode até servir ao próprio indivíduo, mas ela não garante nada em relação ao resto do mundo. O fato de você passar a ver as pessoas que você acusava com misericórdia pode não ter efeito nenhum nelas, e elas podem continuar desprezando você. Talvez desprezem até ainda mais do que antes. Talvez tenham até mais dificuldade para entender alguém que não tem acusações prontas na manga, e que não quer participar do jogo do desprezo e da raiva. Afinal, assim como é difícil ver os humilhadores dispondo-se a ouvir e a assimilar os termos do discurso raivoso dos humilhados, é igualmente difícil ver os humilhados por algum motivo aceitando a condescendência dos humilhadores. Esse jogo não é um jogo que se vence; é um jogo que se abandona.

E tudo bem essa primeira solução não garantir nada em relação ao resto do mundo. Não é nossa responsabilidade salvar o mundo.

A segunda solução, mais difícil, que seria um passo para a reconciliação consiste em «amar os inimigos» (Mateus 5, 44), o que eu interpretaria, no caso de uma obra de arte, como não produzir «transposições acusatórias», para começar…

Memórias do subsolo, porém, não é uma obra evangélica. Ela não traz reconciliação nenhuma. Ao contrário: ela sugere que o homem do subsolo, diante de um ato de submissão, de um pedido de ajuda, vai continuar querendo afirmar sua independência, e sua superioridade. A vantagem, para o leitor, é que ninguém pensa que o homem do subsolo tem qualquer superioridade moral.

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