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057 Os filhos de Tristão & Isolda
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057 Os filhos de Tristão & Isolda

Que amor, que nada. O negócio é ser um «power couple»

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O leitor inocente há de ficar surpreso ao saber que, numa faculdade de Letras, não é lá muito bem vista a ideia de comparar o que você lê com a famosa vida real. O aluno fica num dilema. Ele precisa entregar trabalhos, escrever uma dissertação de mestrado. O detalhe é que motivação muitas vezes nasce do que aprendeu ao comparar sua vida com seus livros favoritos. E é exatamente sobre isso que ele não deve escrever.

Em vez de falar da sua relação com a pessoa amada, de cantar de amor tão docemente em versos em si tão concertados, ou em vez, ao menos, de cantar de amor em linguajar acadêmico e engessado, ele tem de dissecar a obra, quiçá compará-la com outras, mas compará-la com a vida… Com a vida, não.

(Estou falando da faculdade de Letras. Se você for para outras áreas e pesquisar o termo «auto-etnografia», especialmente em inglês, self-ethnography, descobrirá a vasta produção acadêmica que trata de «mim mesmo».)

Legistas de corpos vivos, críticos de culinária que gostam mais de livros de culinária do que de comer — muitas vezes, assim são os professores universitários de Letras.

Por isso há tanto espaço para diletantes falarem de literatura. Talvez o leitor pense que aqui estamos fazendo em português algo que poderia ser feito em academês. Não, não. Aqui estamos fazendo algo distinto, que talvez nem possa mesmo ser feito numa faculdade. Não sei se o que vou escrever seria aceito como projeto de pesquisa. Não sei bem como reempacotar a intuição para agradar à banca.

2 Power couple

Desde cedo quis entender do que estavam falando quando falavam de amor — nem que fosse porque era muito gritante o contraste entre os sublimes poemas nos livros da escola e as experiências de um adolescente numa escola da Zona Sul do Rio de Janeiro.

(Discretamente, entre parênteses, deixo o verdadeiro escândalo: a expectativa de que a escola fosse mais do que a oferenda do meu tempo a um deus pagão que me daria um diploma; a expectativa de que a escola me dissesse algo imediatamente relevante.)

Quando escrevi a respeito de Asako I & II, eu estava pensando justamente nisso. Existem muitas experiências de «amor». Asako I & II me parecia estar falando da mesma experiência de Tristão e Isolda. Você encontra alguém, mas não é exatamente como se tivesse começado uma relação da qual você gosta. Não se trata simplesmente de gostar de outra pessoa, mas também não se trata da diferença entre um «amar» no sentido de estar disposto a sacrificar-se e um mero gostar concupiscente. Estou falando de uma relação que é como que um portal para a transcendência.

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